A Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República (SDH/PR), o Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF), o Observatório de Favelas e o Laboratório de Análise da Violência da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (LAV­UERJ) apresentaram no dia 28 de janeiro de 2015, a 5ª edição do Índice de Homicídios na Adolescência (IHA). O estudo tem como objetivo permitir o monitoramento sistêmico da incidência de homicídios entre a população jovem, contribuindo para a avaliação das políticas de prevenção à violência.

Veja abaixo entrevista exclusiva de Alexandre Ciconello, assessor de direitos humanos da Anistia Internacional no Brasil, sobre a importância dos dados e a atuação da organização para este tema.

O Índice de Homicídios na Adolescência (IHA) com base no ano de 2012 estima que mais de 42 mil adolescentes, de 12 a 18 anos, poderão ser vítimas de homicídio nos municípios brasileiros de mais de 100 mil habitantes entre 2013 e 2019. Isso significa que, para cada grupo de mil pessoas com 12 anos completos em 2012, 3,32 correm o risco de serem assassinadas antes de atingirem os 19 anos de idade. Como você avalia este cenário altamente letal para jovens no Brasil?

Para além dos alarmantes números que o IHA nos traz sobre o risco que os adolescentes brasileiros têm de serem assassinados antes de completarem 19 anos, o mais chocante dessa nova pesquisa é o aumento desse risco no ano de 2012. Esse foi o ano com maior número de homicídios no Brasil desde que os registros começaram a ser feitos, na década de 80. É inadmissível que diante de uma escala tão grande de violência letal contra adolescentes e jovens no Brasil, este tema não seja a grande prioridade da agenda pública nacional e que não haja políticas efetivas de redução de homicídios por partes de governos municipais, estaduais e federal.

Os dados do IHA corroboram outras pesquisas como o Mapa da Violência e o Índice de vulnerabilidade juvenil. Por que o Brasil é um país tão violento para os jovens, em especial os jovens do sexo masculino?

O perfil dos adolescentes e jovens que estão sendo assassinados no país é um ponto importante de ressaltar. Na sua grande maioria são homens e negros. Segundo o IHA, um jovem negro tem um risco 3 vezes maior de ser assassinado que um jovem branco. Os homens têm um risco 12 vezes maior de serem assassinados do que as mulheres. Ou seja, essa violência é seletiva. Com o lançamento do IHA, temos mais uma pesquisa que corrobora com outros levantamentos realizados nos últimos anos no Brasil, que tem demonstrado a vulnerabilidade de nossos adolescentes e jovens, especialmente os jovens negros.

A sociedade brasileira tem naturalizado essas mortes e ainda poucos têm se mobilizado para enfrentar o verdadeiro extermínio de nossos adolescentes e jovens negros.

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Existem dados que mostrem a situação da vulnerabilidade dos jovens no Brasil em relação a outros países?

Sim. O Brasil é o país com maior número absoluto de homicídios no mundo. São 56 mil homicídios por ano. Segundo pesquisas comparativas, o Brasil figura no sétimo lugar em um triste ranking de países com as maiores taxas de homicídios de jovens no mundo. São 30 mil jovens assassinados por ano sendo 7.592 adolescentes entre 12 e 18 anos. Estamos falhando enquanto sociedade em proteger nossos jovens e adolescentes.

A campanha Jovem Negro Vivo, que a Anistia Internacional lançou no ano passado, chama a atenção para o fato de que jovens negros estão mais suscetíveis à violência do que jovens brancos. Como chegou-se à conclusão de que este é um problema relacionado ao preconceito contra estes jovens e não uma questão demográfica, já que os negros são maioria no Brasil?

Não se trata de uma questão demográfica, pois proporcionalmente, o número de negros assassinados é muito maior do que a taxa de homicídios entre a população branca. O número de homicídios entre negros e negras tem crescido nos últimos anos. Uma das razões que mantém a indiferença de parte da sociedade e das autoridades em enfrentar esse problema é o perfil da maioria dos jovens que estão sendo mortos: negros e pobres. Uma das dimensões do racismo entranhado em nossas instituições e subjetividades é acreditar que a vida desses jovens vale menos. São pobres, favelados, muitos dos quais vivem à margem do Estado de Direitos. Ao invés de protegê-los, as políticas de segurança os criminalizam, e as políticas sociais são insuficientes. É importante sempre destacar que é a população negra que mais sofre com a violência letal no país. Isso explica o porque muito pouco tem sido feito nos últimos anos para alterar essa triste realidade.

A taxa referente ao ano de 2012 representa um aumento de 17% em relação a 2011, quando o IHA chegou a 2,84. Na sua opinião, a que se deve este crescimento?

Há vários fatores. O principal deles é a não-priorização da agenda de redução de homicídios na sociedade e nas políticas públicas. Pouquíssimos estados priorizam políticas de redução de homicídios dentro das políticas de segurança pública, que tendem a ter uma postura repressiva e ineficiente para coibir a violência. O governo federal nunca assumiu um papel de coordenação de um pacto nacional de redução de homicídios.

Outro fator importante é a deficiência na política de controle de armas no país. A maioria dos homicídios são cometidos por armas de fogo e mesmo dentro desse cenário há tentativas recentes no Congresso Nacional de flexibilizar o Estatuto do Desarmamento.

Por último, a impunidade e a falência do nosso sistema de justiça criminal que engloba polícias ineficientes, corruptas e violentas; Ministério Público omisso e um poder judiciário lento, sem transparência e distante da realidade social.

O Estatuto da Criança e do Adolescente nunca foi efetivamente implementado no Brasil. Direitos têm sido negados a milhares de crianças e adolescentes brasileiros, resultando nesse risco altíssimo de mortalidade por homicídios na adolescência.

O que pode ser feito para mudar a situação da violência contra jovens no Brasil?

É a sociedade tomar consciência do extermínio silencioso de adolescentes e jovens brasileiros, e se mobilizar para mudar essa realidade. Essa agenda só será prioritária para os governos se houver pressão popular. Por dia, 82 jovens são assassinados no Brasil, isso é um absurdo! Isso nunca poderia acontecer. A Anistia Internacional lançou a campanha Jovem Negro Vivo esperando contribuir com uma ampla mobilização nacional e internacional pelo fim dos homicídios no país. O destino de todos os jovens é viver!

Fonte: Anistia Internacional

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